sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

E se o sinalizador tivesse acertado o Alexandre Pato?

O instrumento da morte do garoto boliviano Kevin Beltrán Espada, de 14 anos, na noite de 20 de fevereiro de 2013, foi um sinalizador naval. Os maiores culpados pela tragédia, no entanto, são Nicolás Leoz Almirón, um senhor de 84 anos que, desde 1986, ocupa a cadeira de presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol, a Conmebol, e todos os demais presidentes de confederação nacionais que ratificam todas as decisões do dirigente.

Ao que indicam as evidências, o perpetrador do disparo, acidental ou não, foi um torcedor corintiano presente ao Estádio Jesús Bermudez, na cidade de Oruro, interior da Bolívia, onde o Corinthians empatou, por 1 a 1, com o San José,  em sua estreia na Taça Libertadores 2013. O local da ocorrência e seu protagonista, no entanto, poderiam ser vários, já que a Conmebol é omissa no que diz respeito à organização das suas competições e, consequentemente, na provisão de segurança para os consumidores de seus campeonatos. Sim, consumidores.

Desculpem-me os românticos, mas está na hora de o torcedor parar de achar que frequentar jogos de futebol tem de ser um sacrifício, ou profissão de fé. Até quando a Taça Libertadores da América, um dos  torneios mais desejados do planeta, vai ser disputada em estádios precários? Até quando vamos achar graça, e fazer troça, com escanteios sendo cobrados sob escudos de policiais? Até quando jornalistas não vão ter condições mínimas de trabalho nos estádios? Por que os jogos da segunda mais importante competição continental entre clubes continuam sendo tratados com tanto desdém? Com tanto amadorismo?


Bolívia? Venezuela? Não, leitor, Brasil. Quem trabalhou como jornalista na final da Libertadores do ano passado, no Pacaembu, sabe do que estou falando. Em campo, duas das camisas mais valiosas da América do Sul. Nas numeradas cobertas, jornalistas com seus computadores portáteis no colo, dividiam o setor com torcedores, que, com todo o direito, levantavam-se para acompanhar lances mais agudos, bloqueando a visão de quem tinha de ver o jogo para reportar o que acontecia.

Há quatro anos, convivemos com o tal caderno de encargos da Fifa, para os estádios da Copa do Mundo. Ok, a Fifa talvez exagere um pouco nas exigências. Mas a Conmebol exagera no que permite. Para a Conmebol, tudo pode. Qual foi a última punição perpetrada pela confederação? Tente puxar pela memória. Que eu me lembre, a última vez que alguma agremiação filiada à Conmebol sofreu punição foi em 1989, quando uma torcedora brasileira disparou um sinalizador no gramado do Maracanã. Mas o punido não foi o Brasil, via CBF, mandante e organizador da partida. Foi o Chile, cujo goleiro Rojas fingiu ter sido acertado. O país de Valdivia ficou quatro anos sem poder disputar competições oficiais. Rojas foi banido do esporte como jogador. E foi só.

Pilhas, chinelos, rádios. Quase todo jogo da Libertadores têm arremesso de artefatos no campo de jogo. Vestiários sem condições mínimas são corriqueiros. Padronização no que diz respeito à segurança, também é algo que não existe. Torcedores do Corinthians que retornaram de Oruro relataram não terem passado por revista antes de adentrar o estádio. E se o sinalizador tivesse sido apontado para o campo? E se tivesse acertado, por exemplo, o Alexandre Pato, ou qualquer outro jogador? Vamos continuar fingindo que isso não poderia acontecer?

Em decisão na qual cabe recurso, o Corinthians foi punido. A Conmebol vetou a presença de torcedores alvinegros nos estádios até o fim da participação da equipe na Libertadores. Nem dentro, nem fora de casa.  Diante disso, se eu fosse Mário Gobbi, presidente do Corinthians, tomaria uma medida drástica e tiraria o meu clube da Libertadores. E faria o mesmo se fosse presidente de Palmeiras, São Paulo, Atlético-MG, Grêmio, Fluminense, Boca Juniors, San José ou qualquer outro participante.

O mal que a morte de Kevin Beltrán fez à imagem do Corinthians é imensurável. É muito possível que nem todos os países da Europa tenham mostrado as imagens de Alessandro levantando a taça do Mundial de Clubes, em dezembro do ano passado, por exemplo. Mas sou capaz de apostar que não houve um país, exceto, talvez, a Coreia do Norte, que não tenha exibido o noticiário sobre o caso.

Não isento, de modo algum, o torcedor que entrou no estádio com um sinalizador. Mesmo se a polícia de Oruro tiver permitido. Mesmo se o disparo tiver sido acidental. É no mínimo uma imbecilidade um sujeito entrar com um aparato com tanto potencial lesivo em um estádio de futebol. Mas a culpa tem de ser dividida. Quem organiza o evento tem de prover as condições mínimas de segurança. Quem hospeda o evento, também.

Como qualquer outro participante da Libertadores, o Corinthians é parte vítima, parte co-responsável pelo que ocorreu. Vítima porque disputa uma competição mal-organizada, que não respeita seu próprio potencial e importância. Co-responsável, pois é conivente com a incompetência da Conmebol. Aconteceu com o time do Parque São Jorge, mas poderia ter acontecido com qualquer clube. Aconteceu com Kevin Beltrán Espada, mas poderia ter acontecido com você, que está lendo esse texto.

E aí? Vamos esperar mais alguém morrer para fazermos alguma coisa? Vai sobrar só para o Corinthians?

2 comentários:

  1. depois de tantas asneira que li hj no Facebook a respeito do assunto é o texto mais coeso que li ! parabéns pela matéria e pela visão !



    ResponderExcluir
  2. TEM Q SOBRAR E MUITO PRO CORINTHIANS.....ESSA TORCIDA É UM BANDO DE RETARDADOS E NAO DE LOUCOS.

    ResponderExcluir