terça-feira, 18 de dezembro de 2012

"Chupa, seu Anti", e assim por diante


Proponho de imediato, antes que você continue a ler este texto, um acordo: vamos deixar de hipocrisia e assumir que grande parte da graça do futebol é a desgraça de um adversário? Que ninguém vive apenas do seu clube, e que parte de se torcer para um time é justamente ter alguém como arquirrival? Que não existe frase mais mentirosa do que "O time X é Brasil na Libertadores/Mundial/Desafio ao Galo"? 

Ok. Se você ainda está lendo, deve ter concordado. Futebol, e esportes em geral, pressupõem competição. O que, por consequência, supõe que alguém vá ganhar as disputas - e que outros vão perdê-las. 


O ano de 2012 no esporte brasileiro vai ficar marcado, entre outras coisas, pelo surgimento do "Anti". Cunhado pelos corintianos durante a disputa da Libertadores, o termo serve para designar os secadores que torcem para outros clubes e que, claro, queriam que o Corinthians não vencesse o campeonato. Apenas pelo prazer de ver os corintianos derrotados? Também, é claro. Mas não só. 

Um Corinthians campeão da Libertadores implicava, para todos os demais, que o seu próprio time havia sido derrotado - em especial para santistas e vascaínos, no caso. Acima de tudo, significava um Corinthians classificado para o Mundial de Clubes, com chance de ser campeão mundial. Ou, para torcedores de outros clubes, uma calamidade. Torcer contra isso era dever de qualquer torcedor de outro time que se prezasse. Porque, acima de tudo, havia um potencial efeito prático. 

Um Corinthians campeão é um Corinthians com mais dinheiro e prestígio para contratar, assinar contratos de publicidade e, assim, com mais chance de seguir sendo campeão. O que significa, para os outros torcedores, continuar perdendo. Torcer contra isso? Nada mais normal... Muitos corintianos, porém, entenderam que não. Mesmo aqueles que roeram as unhas em frente à TV quando o Palmeiras enfrentou o Manchester United, em 1999. 

O são-paulino, o palmeirense e os demais não poderiam se manifestar contra o Alvinegro. Torcer contra o Corinthians virou comportamento reprovável. "Se o seu time não está jogando, porque você está assistindo?", muitos indagavam, via redes sociais. O "Chupa, Anti!", virou lema. Cada gol do Corinthians era comemorado com "Chupas" para "Bambis" e "Porcos" nas janelas. Quase tão ouvido quanto "Vai, Corinthians!", ao menos na minha vizinhança. Sobre o "Chupa", aliás, o Xico Sá já escreveu brilhantemente tudo o que poderia se dizer sobre o assunto aqui

Meses depois do título alvinegro, o Palmeiras se viu sob enorme risco de rebaixamento no Brasileirão. A meu ver, o rebaixamento foi selado no dia em que o Verdão perdeu para o Coritiba, por 1 a 0, em Araraquara. Curioso. A não ser que o Coxa tenha uma torcida muita grande na capital paulista, aqueles fogos que espocaram devem ter sido soltados por torcedores de times rivais do Palmeiras. Aqui na redação do jornal em que trabalho, por exemplo, deve haver uma embaixada paranaense que eu desconhecia. Porque a gritaria na hora do pênalti cobrado pelo Deivid foi digna de arquibancada. 

Em Yokohama, uma faixa "Chupa Porco" era destaque no meio da arquibancada. Sim. Um corintiano atravessou o mundo com uma faixa provocativa ao rival e fez questão de pendurá-la para as câmeras de todo o planeta captarem. Um outro levou um caixão alviverde, com o distintivo do Palmeiras. Sabe o que é isso, leitor? É futebol. É respeito pelo seu rival. É o reconhecimento de que não ter o inimigo no cangote, enchendo o saco, é um alívio.  No dia em que ninguém sacanear uma derrota do seu time, comece a lamentar-se. Seu time tornou-se insignificante. 

Aí chegamos à atitude do cantor Thiaguinho, mestre de cerimônias da festa alvinegra nas ruas de São Paulo, no último 18 de dezembro, pela conquista do Mundial de Clubes. Thiaguinho é corintiano e tem todo direito de ser. E, como todo bom corintiano, claro, ele está felicíssimo com o rebaixamento do Palmeiras. Como também estaria com uma queda do São Paulo ou do Santos, por exemplo. Quando chamou o grito provocativo contra o Palmeiras, pelo rebaixamento, o cantor estava fazendo o esperado. Não é coisa de "Anti", não. É coisa de corintiano. Como seria de palmeirense se, digamos, o Belo, que é pagodeiro e palmeirense, fizesse o mesmo. Mas, quando puxou ao microfone o elegante "Ei, Palmeiras, vai tomar no C...", Thiaguinho cruzou a linha. Isso se chama ofensa. 

"Ai, é normal", dizem muitos corintianos e thiaguistas (existem e coincidem em muitos casos, acredite). Não, não é normal. Será que Thiaguinho não imagina que existam muitos admiradores do trabalho dele que torcem pelo Palmeiras? Será que ele não consegue dimensionar o tamanho do erro que cometeu? Parece-me que não. Porque mais tarde, em seu perfil no Facebook, o cantor se defendeu. Escreveu que sabia ter admiradores que torciam por outros times. E saiu-se com essa: "Gravei um DVD no Palestra Itália... Quer mais exemplo de neutralidade... Quem me conhece sabe como sou. Justo."

Neutralidade? Justiça? Não, Thiaguinho. O que o palmeirense queria de você era respeito. Você errou como artista e personalidade pública. Assim como erram os palmeirenses que estão pregando a sua morte em redes sociais. É, velho. Isso já está acontecendo. 

Era melhor ter ficado quieto, né? 

Atualização do dia 19/12: Um dia após o incidente, o cantor Thiaguinho gravou vídeo, exibido no programa Mais Você, compareceu ao Globo Esporte e reuniu-se com integrantes da Torcida Uniformizada Mancha verde. O objetivo do cantor era se desculpar pelos exageros do dia anterior. Melhor assim, para todos. 

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