sábado, 22 de maio de 2010

Adeus, Palestra


Tenho boa memória, mas não me lembro do meu primeiro jogo no Palestra Itália. Creio que tenha sido lá por 1983, 84. Mário Sérgio comandava o Palmeiras. Acho que foi contra a Ferroviária de Araraquara. Fui a pé, com o meu pai. Eram poucos os momentos que eu tinha com meu pai, só a gente, quando eu era pequeno. Ele chegava tarde em casa, quase sempre bravo, como eram todos os pais da minha infância. Mas, nos dias de jogos do Palmeiras, meu pai e eu éramos um time.

Do meu último jogo, lembro bem, muito mais do que gostaria. Foi o último jogo do Diego Souza no Palmeiras. Foi o primeiro da eliminação na Copa do Brasil de 2010, contra o Atlético Goianiense. Ao menos vencemos - mas com um gol de pênalti, no último minuto, marcado pelo Cleiton Xavier.

Dizem que hoje, 22 de maio de 2010, no ano em que entro na casa dos 30, acontecerá o último jogo do Estádio Palestra Itália. Eu não tenho tanta certeza. Torço, honestamente, para que inventem um último amistoso, uma despedida honrosa. Porque hoje, não irei ao estádio. A chance de derrota frente ao Grêmio é grande demais, e não quero me despedir do nosso estádio com mais uma derrota - desejo que esse parágrafo seja veemente negado pelo jogo que acontecerá daqui a pouco, dado que escrevo esse texto às 15h30, três horas antes da partida.

Também não creio que será o último jogo porque tenho dúvidas sobre a construção da tal Arena Palestra Itália – se é que não haverá o nome de alguma marca no meio do nome do estádio, não que isso seja necessariamente ruim.


O biênio 2009/2010 não foi exatamente o que eu esperava para o Palmeiras. Aliás, creio que nenhum palmeirense esperava tantas decepções em tão pouco tempo. O presidente que era para ser um salvador faz uma administração ruim. A diretoria trabalha mal. Os atletas não parecem querer estar no clube – talvez porque não recebam em dia. E a oposição, nociva, se regozija a cada derrota de uma camisa que eles, como palmeirenses que se dizem, deveriam sempre querer ver vencedora, doa a quem doer.

Lembro do estádio quando ainda havia um espaço entre o setor “Reservado para Sócios” e as numeradas descobertas. Da época em que chegávamos ao estádio bem cedo, para não pegar filas, e só saíamos bem depois do fim do jogo, para evitar o “pêndulo” no meio da multidão. Quando não é possível andar, apenas balançar o corpo de um lado para o outro, na tentativa mínima de locomoção. Bem naquele trecho em que o jornalista Chico Lang, que nunca deve ter pisado no Palestra, tem até hoje sua sexualidade questionada pela torcida.

No Palestra, chorei pela primeira vez com futebol ao ver o Cuca, esse mesmo técnico de triste figura, outrora um meia raçudo e muito forte, marcar no gol do placar, pular as placas de publicidade e simular uma faixa de campeão. Eu já tinha 12 anos em 1992, e nunca tinha visto meu time ser campeão. Lembro também do dia em que o Leão foi expulso, talvez em 86 – mais um jogo que eu acho que foi contra a Ferroviária – e arrumar um dos maiores quebra-paus que eu já tinha visto. Lembro de um Palmeiras X Rio Branco, com meu tio-avô Mario Iwata, em um dia de tarde, quando uma tempestade impediu o jogo de terminar. Foram horas dentro do Palestra, esperando a inundação da Rua Turiaçu permitir nossa saída. A chuva também caiu pesada na reestréia do Evair, em 92. Batemos a maldita Inter de Limeiras por 1 a 0.

Certa vez, tive que pedir a um torcedor qualquer que fingisse ser meu pai, porque menores passaram a só entrar acompanhados, a partir de 1995 no estádio, para ver um Palmeiras X Bragantino, por uma Taça Conmebol qualquer. Meu pai de verdade, inteligentemente, preferiu ver pela TV. Vi também o Romário acabar com a gente em 2000, naquele 3 a 4 de virada, um dos maiores jogos de futebol que já presenciei. E, claro, assisti a quase todos os jogos que fizemos pelas Libertadores de 94 para cá, inclusive o show de Alex no 3 a 0 contra o River Plate, em 1999, bem como o título nos pênaltis, semanas depois, contra o Deportivo Cali. Marcos correu para o lado das arquibancadas em que eu estava depois que o Zapata bateu aquele pênalti para fora. Muitos outros pênaltis defendidos e convertidos, bolas na trave, no ângulo, no cantinho e muito longe das metas, para alegria do José Silvério que mandava um sonoro “Essa foi láááááááá na piscina(m)!”, vez por outra, reaparecem na minha memória.

O último título que vi no Palestra foi o Paulista de 2008. O troféu foi entregue contra a Ponte Preta. Mas a conquista veio mesmo naquele 2 a 0 contra o São Paulo. Aquele do gás de pimenta, no dia em que um gol do Valdívia fez com que a torcida, o Rogério Ceni e um transformador explodissem quase ao mesmo tempo, após uma das dancinhas mais lindas e ridículas que já vi alguém fazer para comemorar um gol. Que bom, eu também estava lá.


Creio ter assistido a mais de 200 jogos no Estádio Palestra Itália. Alguns no camarote do Renato Mauro "Boi", ao lado da Tribuna de honra da Federação Paulista de Futebol, e muitos nas arquibancadas, com o Fábio "22" Donatelli, o Fábio Fujita, o Fernão Ketelhuth, o Vicente Laganaro, o Nélson Sambrano, o Régis Cavinato, o Rafael Faro, o César “Paulo Nunes”, o Diógenes Menon, meu tio Luiz Costa, os amigos do meu pai, especialmente o Siro Casanova e o Roberto Faria, e tantos outros amigos que, injustamente, não irei citar. Até ex-namoradas e esposas eu fiz sentar naquele chão de cimento áspero, para ver, por exemplo, um Palmeiras X Anapolina, pela Série B de 2003. Mas, certamente, a maior parte dos meus jogos no Palestra, eu vi mesmo com o meu pai Wagner Cano Lima, que foi quem me ensinou a amar o Palmeiras, para qual até hoje, e cada vez mais, ele finge não dar a mínima. Pai, você não me engana. E, mais uma vez, muito obrigado.

Se de fato o Estádio Palestra Itália, o velho Parque Antarctica, for mesmo sair de cena para dar lugar a uma moderna arena, e se isso é o melhor para o Palmeiras, que assim seja. Mas que os dirigentes do clube, os da oposição também, saibam que junto com o entulho que vão jogar nas caçambas segue parte importante das vidas de milhões de palestrinos que também cresceram ali sentados, que tomaram chuva e frio, mataram as baratas que saiam da tubulação da arquibancada lateral, que torceram sem esperar nada em troca e que talvez tenham tido a sorte de, como eu, terem sido sócios do clube.

Vá com Deus, vecchio Palestra. E que você encontre dias melhores quando reabrir ainda maior e mais imponente. Eu pretendo estar por aqui para te receber.

2 comentários:

  1. meus poucos momentos no Palestra Itália eu não me esquecerei jamais!!!

    QUE VENHA A ARENA! mas que fique nossa saudável saudade do nosso (desde 1920) bom e velho Palestra Itália!

    meus melhores momentos, registrados em vídeo e eternamente na memória:

    # Brasileiro 2007, não pegamos vaga na Libertadores, mas…
    Festa no Palestra Itália pelo rebaixamento dos gambás
    http://www.youtube.com/watch?v=2XJM01GZ5Us

    # Semi-finais do Paulista 2008, na hora do apagão
    Torcida canta "Eliminado!" e o Hino
    http://www.youtube.com/watch?v=6kYSvB15Mdc

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  2. muito bonito o texto!
    =)
    é péssimo ver lugares que marcaram nossa vida sumir por conta de interesse imobiliário... mudanças para melhor, mas melhor pra quem né? ainda mais num país tão corrupto e cheio de discrepâncias como o nosso.
    mas ainda bem que podemos ficar com as nossas lembranças!

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